"A GÊNESE DAS FACÇOES CRIMINOSAS: COMANDO VERMELHO E TERCEIRO COMANDO." PARTE 2
Na conclusão da entrevista sobre o livro “A Gênese das Facções Criminosas: Comando Vermelho e Terceiro Comando.”, o autor FÁBIO SAMU, cineasta e educador, nos traz uma perspectiva única, baseada em sua experiência com o Projeto JURISDRAMA, voltado à educação de apenados por meio da dramaturgia, percorrendo as correntes ideológicas que diferenciam o Comando Vermelho do Terceiro Comando, examinando suas distintas estratégias operacionais e as narrativas culturais que informam sua existência. Em última análise, este episódio serve como uma exploração convincente das realidades multifacetadas do crime no Brasil, desafiando os ouvintes a se envolverem com os contextos históricos que sustentam a ascensão dessas organizações criminosas e seu impacto contínuo e duradouro na sociedade.
Saiba mais!
- Terceiro Comando – Wikipédia, a enciclopédia livre
- Entrevista com André Torres, fundador do Comando Vermelho, crime organizado, 1997 - Trip
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- Comando Vermelho – Wikipédia, a enciclopédia livre
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Transcript
Honoráveis Ouvintes! Sejam muito bem-vindos a mais um episódio do Hextramuros! Sou Washington Clark dos Santos, seu anfitrião! No conteúdo de hoje, trago a conclusão da conversa sobre o livro A Gênese das Facções Criminosas, Comando Vermelho e Terceiro Comando, com o autor Fábio Samu, cineasta e educador, que nos traz uma perspectiva única baseada em sua experiência com o projeto JURISDRAMA, voltado à educação de apenados por meio da dramaturgia, percorrendo as correntes ideológicas que diferenciam o Comando Vermelho do Terceiro Comando, examinando suas distintas estratégias operacionais e as narrativas culturais que informam sua existência. Em última análise, este episódio serve como uma exploração convincente das realidades multifacetadas do crime no Brasil, desafiando os ouvintes a se envolverem com os contextos históricos que sustentam a ascensão dessas organizações criminosas e seu impacto contínuo e duradouro na sociedade. Assim, na sequência de nossa conversa, Fábio; de que forma os eventos históricos relatados no livro ainda repercutem nas dinâmicas do crime organizado no Rio de Janeiro hoje?
CONVIDADO:Vamos dizer, assim, que, entre mil novecentos e setenta e nove e mil novecentos e oitenta e um, houve uma mudança no modelo organizacional de Ilha Grande. Os LSNs começaram a entrar em extinção, por um lado e, por outro lado, não houve uma renovação de assaltantes de banco! Porque assaltante de banco era uma pena pesada e, por outro lado, o tráfico estava "bombando"! Então, se o cara queria ir para a vida do crime, era muito melhor ser traficante do que assaltante de banco! O número de assaltantes de banco começou a diminuir absurdamente dentro de Ilha Grande! Em contrapartida, o número de traficantes começou a aumentar! E os LSNs, como não queriam viver dentro da cadeia, - eles eram fujões -, defendiam um modelo organizacional horizontal. Vamos pensar o seguinte: o assaltante de banco; não existe líder! Quem tem a planta do banco é que vai comandar! Ele vai chamar as pessoas. Ele está no comando. Se um indivíduo não concorda, simplesmente não participa desse assalto ao banco e segue a vida dele. Não existe uma hierarquia entre eles. Por isso que os LSNs não pregavam uma hierarquia em Ilha Grande. O modelo organizacional dos traficantes é hierarquia. Tem o patrão e o patrão comanda! Então, Ilha Grande começou a ser toda marcada! Os traficantes da segunda galeria marcaram os pontos e eles foram dividindo Ilha Grande, até o momento que Ilha Grande já estava toda demarcada! Isso ocorreu, mais ou menos, em mil novecentos e oitenta e um, saindo de uma organização horizontal para uma organização vertical. Ou seja: o LSN não marca território, mas, o traficante, marca território. Isso faz parte da natureza de ambos. Um, o objetivo é assaltar o banco e sumir! O outro não! O outro marca o território. Se ele sumir, outro vai vir e tomar aquele espaço que era dele. É assim que funciona! Em mil novecentos e oitenta e um, ocorreu o “episódio dos bancários”, onde o LSN José Jorge Saldanha alugou um apartamento no Conjunto dos Bancários e se fazia passar por juiz. Ele pagava cerveja para os moradores e o objetivo era obter informações para pôr em prática assaltos a banco. Só que a polícia estava atrás dessa galera! Então, um grupo de policiais recebeu uma informação e foram averiguar lá no Conjunto dos Bancários. Quando eles chegaram lá, havia uma briga de vizinhos. E os LSNs estavam assistindo. E um dos LSNs identificou a polícia. E aí começou-se um grande tiroteio! Alguns conseguiram fugir, a polícia prendeu outros e o Saldanha se entocou dentro de um apartamento. Ele não se rendeu e a polícia tentou várias vezes invadir o apartamento sem sucesso. Ele executou vários policiais, deixou outros feridos até ser abatido por um tiro de escopeta. Esse episódio, a manchete do jornal "O Globo", falava de quatrocentos policiais contra um homem - José Jorge Saldanha! Daí, o amigo dele, o William da Silva Lima, vulgo professor, colocou como título do seu livro, "Quatrocentos Contra um - A história do Comando Vermelho". Só que, no livro do William, em nenhum momento ele diz quando que a galera da segunda galeria assumiu a denominação Comando Vermelho, porque, até então, a mídia falava muito em Falange Vermelha. Os LSNs negam que existiu a Falange Vermelha! No meu livro, eu respondo da seguinte maneira, se alguém me perguntar: a Falange Vermelha existiu ou não existiu? Eu vou dizer: tudo depende do ponto de vista! Do ponto de vista da mídia e da polícia, a Falange Vermelha existiu! Eram os presos comuns da Lei de Segurança Nacional! Como eles assaltavam bancos, tinham cunho político! Então, era a Era das Falanges! Tinha a Falange Jacaré, Falange Zona Sul, Falange Zona Norte e, a mídia, passou a chamar essas pessoas de Falange Vermelha. Só que, eles, nunca se intitularam Falange Vermelha e, a partir de um determinado momento, o William, no livro dele, diz que o Nelson Bastos Salmon fala também da denominação Comando Vermelho e, também, a mídia começou a falar desse nome - Falange Vermelha e Comando Vermelho - e a galera da segunda galeria deve ter pensado: "se estão falando num Comando Vermelho, vamos nos assumir!" Eles não se enxergavam como Falange Vermelha! Eles eram presos da Lei de Segurança Nacional e a massa carcerária se referia a eles como o "pessoal da lei". Então um outro nome era necessário para unir essa nova massa carcerária, que já não tinha mais os LSNs como a comissão de frente. Eles adotaram o nome Comando Vermelho. Uma coisa que não é dita na obra do William é quando os traficantes da segunda galeria assumiram o nome Comando Vermelho e eu fiz essa pergunta para ele e a resposta foi mais ou menos óbvia: que eles assumiram esse nome depois da morte do Saldanha, porque, foi nesse período, que começaram a surgir desavenças em Ilha Grande. Eu não consegui determinar se isso ocorreu no ano de mil novecentos e oitenta e três ou no ano de mil novecentos e oitenta e quatro... houve um conflito dentro de Ilha Grande. Não houve nenhuma morte. Esse conflito foi contido e, o governador da época, Leonel Brizola, mandou os insurgentes da Terceira Galeria para Água Santa e manteve, lá, Ilha Grande como estava. Quando ele toma essa atitude, Ilha Grande passou a ser um QG do Comando Vermelho e esses insurgentes da Terceira Galeria vão para Água Santa e lá eles juntam com os presos de Água Santa e fazem uma base insurgente contra o Comando Vermelho. E eles resolvem dar o nome desse grupo de Terceiro Comando, porque os pioneiros desse grupo faziam parte da terceira galeria de Ilha Grande.
ANFITRIÃO:Que lições o poder público pode tirar da história dessas facções para desenvolver políticas mais eficazes de combate ao crime e também de prevenção?
CONVIDADO:Na minha avaliação, o poder público precisa ter um olhar voltado para o sistema prisional! Que as facções criminosas surgiram dentro do sistema prisional e o sistema prisional não cumpre o seu objetivo! E isso não é de hoje! Para dar como exemplo, eu vou citar aqui um artigo da Constituição: “as cadeias serão seguras, limpas e bem arejadas, havendo diversas casas para separação dos réus, conforme suas circunstâncias e a natureza dos seus crimes.” Esse é o inciso cinte e um do artigo dezessete. Agora, o interessante é que nós tivemos várias constituições! E esse é um artigo da Constituição de mil oitocentos e vinte e quatro! Então, lá atrás, já se identificava que o sistema prisional estava fadado ao fracasso! O Estado brasileiro precisa realmente adotar políticas que façam com que o sistema prisional cumpra a sua função. Enquanto nós não fizermos isso, o sistema prisional vai ser um instrumento para fortalecer as facções criminosas!
ANFITRIÃO:Pela sua vivência, consegues apontar avanços que poderiam ser implementados dentro do sistema prisional para prevenir a articulação e a expansão dessas organizações?
CONVIDADO:Eu diria que o sistema prisional, desde sempre, foi abandonado! Ninguém se preocupou com ele e, por isso, hoje, nós estamos vivendo um período de violência urbana totalmente fora do controle! Para que possamos mudar isso, nós devemos superar dois paradigmas: um, que eu digo, que é da esquerda, que diz que: bandido é vítima da sociedade! A gente tem que parar com essa ideia! Bandido é bandido! Ele tem que ser tratado como bandido! Ele tem que ser detido pelas forças de segurança e, a partir do momento que ele entra no sistema prisional, o sistema prisional deve cumprir o seu papel de reabilitação e ressocialização desse indivíduo para que ele possa ser reintegrado à sociedade e não cometa mais crimes. Leve uma vida fora da vida criminosa! A direita, por sua vez, fala do bandido bom é bandido morto! Só que, se as forças de segurança prenderem esse indivíduo e não o matar, ele vai ser colocado dentro de uma prisão! E se a prisão não cumprir o seu papel, ele vai sair de lá muito pior do que ele entrou! Nós precisamos superar esses dois paradigmas! Enquanto não superarmos, nós não vamos caminhar!
ANFITRIÃO:Meu caro, caminhando para o final de nossa conversa, o parabenizo pela obra e repriso os meus agradecimentos pela sua esclarecedora contribuição! Deixo este espaço para suas considerações finais. Grande abraço!
CONVIDADO:Ao ouvinte que está nos ouvindo, independente do estado em que ele mora, eu vou citar aqui como exemplo o Rio de Janeiro: o Rio de Janeiro é a única cidade do mundo onde um helicóptero da polícia é abatido pelas forças criminosas! Em lugar nenhum do mundo isso acontece! Dito isso, é importante frisar que os problemas relativos à violência urbana não serão resolvidos a curto prazo! Somente uma política eficiente a longo prazo irá resolver! Só que nós precisamos começar a fazer as coisas que precisam ser feitas! Quanto mais nós demorarmos a iniciarmos esse processo, mais distante, ainda, será resolver os problemas que nos afligem! Para aqueles que quiserem se inteirar mais sobre as coisas que ocorrem no JURISDRAMA, tem o meu perfil no Facebook, que é Fábio Samu; tem no Instagram, @samufabio, e tem o canal do JURISDRAMA no YouTube.
ANFITRIÃO:Honoráveis Ouvintes! Este foi mais um episódio do Hextramuros! Sou Washington Clark dos Santos, seu anfitrião! No conteúdo de hoje, encerramos a entrevista com Fábio Samu, autor do livro “A Gênese das Facções Criminosas: Comando Vermelho e Terceiro Comando.” Quer saber mais sobre este conteúdo? Acesse nosso website, inscreva-se e compartilhe nosso propósito! Será um prazer ter a sua colaboração! Pela sua audiência, muito obrigado e até a próxima!